Fiscalidade e sustentabilidade das micro,
pequenas e médias empresas
Intervenção do Dr. José Carlos Marques
Membro da Direcção da
Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC)
1. Sistema Fiscal; Obstáculos à
competitividade; Carga Fiscal exagerada; Funcionamento da Justiça; Burocracia
Em Portugal a tributação é exagerada, o que penaliza a
competitividade do tecido empresarial. O excessivo sacrifício fiscal resulta,
em grande parte, do Estado gastar muito e gastar mal. Por ser assim, tem de
arrecadar receita para além do razoável. Essa necessidade de cobrar impostos
elevados tem conduzido a uma espécie de perseguição fiscal, quase sempre contra
os contribuintes razoavelmente cumpridores.
O combate à fraude e evasão fiscais deve ser intensificado
de modo a evitar injustiças na repartição da carga tributária e distorções na
concorrência. Infelizmente este combate traduz-se muitas vezes num mero,
desesperado e prepotente esforço de cobrança com total inobservância da lei.O
sistema fiscal deve ser propiciador do investimento, nacional e estrangeiro,
incentivador da poupança e contribuir para a criação de emprego.
Outro problema grave da nossa fiscalidade é a constante
alteração da legislação, o que cria dificuldades evitáveis, gera uma
complexidade gigantesca no cumprimento das obrigações tributárias e instala uma
imprevisibilidade absolutamente nefasta.
Acresce que grande parte das normas legais são obscuras e
ignoram a realidade.
A informação “circulante” do Fisco é também geradora de
atropelos ao bloco da legalidade.
Os meios graciosos de defesa da legalidade – pedidos de
revisão, reclamações graciosas e recursos hierárquicos, entre outros – são em
regra desconsiderados, o que obriga os contribuintes a recorrer
sistematicamente à via judicial, o que é caro, demorado e muito prejudicial
para o quotidiano dos contribuintes.
As garantias exigidas para suspensão da execução fiscal
também são fortemente penalizadoras para os cidadãos e empresas. A quase inverificação da prescrição também é
inaceitável.
A burocracia a que estamos sujeitos para cumprir as
obrigações fiscais é muito penalizadora, principalmente para as empresas de
pequena e média dimensão.
2. Comunicações aos sujeitos passivos;
Comunicações aos Contabilistas; Divergências E-Fatura – Declarações Períodicas
do Iva com reflexos nos Reembolsos de Iva
A recente polémica com as comunicações do E-Fatura e as
Declarações Periódicas do IVA assume especial gravidade no que se refere aos
reembolsos. A AT tem feito comunicações aos Sujeitos Passivos de divergências
que nalguns casos não existem e que noutros casos são da responsabilidade do
Estado. Este lamentável e censurável comportamento da AT onera injustamente os
contribuintes e traduz-se numa excessiva e evitável carga de trabalhos para os
Contabilistas.
Não desconhecemos que impende sobre os Contabilistas e os
contribuintes um dever de colaboração.Mas esse dever é muitas vezes o pretexto
para exigências claramente abusivas e muitas vezes até ilegais.
Está próximo o dia em que o Estado vai tentar colocar os
Contabilistas a substituírem-se aos seus funcionários!!! É verdade que o nosso sistema fiscal penaliza
a competitividade do País. Mas também é certo que os agentes empresariais têm
de fazer pela vida, adaptando-se às alterações da realidade de modo a serem
sustentáveis. Precisam de saber fazer o diagnóstico, apostar no planeamento
estratégico e na formação dos colaboradores. Ora, não podemos nunca perder de
vista que, acima de tudo, temos de defender os interesses de quem contrata os
nossos serviços!!!
3. As normas contabilísticas, determinam uma
base legal; Enquadramento divergente;
Por ser pertinente e com referência aos normativos legais,
veja-se o entendimento dissemelhante, entre o Decreto Lei nº 372/2007, de 6 de Novembro – artigo 2º do
anexo ( Considera-se Micro Empresa as que tenham menos de 10 empregados e um
Volume de Negócios ou Balanço que não exceda 2 milhões de euros; Considera-se Pequena Empresa a que tenha
menos de 50 empregados e um Volume de Negócios ou Balanço que não exceda 10 milhões de euros)
e a norma contabilística aplicável – NCM nº 36- A/2011 de 9 de Março, aplicável
até 31/12/2015 (esta considera como Micro Empresa a que tenha um número médio
de 5 empregados e um VN, ou balanço, de 500 mil euros. Pelo DL 98/2015, as Micro
Empresas passam a integrar o Sistema Nacional de Contabilidade, a partir de
01/01/2015, e passa a considerar o valor de 350 mil euros para o valor do
Balanço, 700 mil euros para o VN e o número médio de empregados passa a ser de
10
Existe, assim, uma desarmonização com reflexos divergentes
entre os valores constantes do Decreto que considera as entidades para
aplicação dos Benefícios Fiscais e a norma aplicável em sede de IRC e a Norma
contabilística.
4. Maioria das micro empresas não é rentável
Como reflexo daquela desarmonização saiu esta semana num Jornal de
referência uma notícia cujo título era: “Maioria das micro empresas e não é
rentável”. Segundo o Banco de Portugal 89 % das empresas empregam menos de (10
pessoas) e têm um VN inferiores a 2 000 milhões de euros e em média a
rendibilidade líquida é negativa (- de 3%)
Referem ainda que as PME foram as mais rentáveis, com 2.6%
do seu VN.
Esta notícia, parece-me a mim contudo desajustada em termos
de enquadramento das Micro considerando que 2 000 milhões de VN, não
corresponde aos desígnios de micro entidade no atual contexto económico.
Não se deve perder de vista a função social destas
entidades. A coleta de IRC é, em regra, suportada por um pequeno número de
contribuintes. Mais de 80% do IRC é suportado por menos de 10% das empresas.
Acresce que 25% a 30% das empresas não pagam nada.
As micro e pequenas empresas representam mais de 95% do
tecido empresarial, são na sua maioria de base familiar e geradoras de emprego.
5. Enquadramento fiscal da restauração para
2016, um alerta
Não quero deixar de referir o novo enquadramento fiscal para
a restauração, que passará da taxa normal para a taxa intermédia. Há quem
defenda que isto é um financiamento direto do Orçamento de Estado aos Sujeitos
Passivos da restauração. Da minha parte não farei qualquer comentário por
enquanto, uma vez que a informação disponível ainda é escassa. Tem-se falado
que a redução da taxa permitirá a criação de mais postos de trabalho. Tenho
sérias dúvidas que venha a ser assim. As empresas não alterarão a estrutura que
está montada por causa desta medida. Penso que só em casos excecionais é que
isso acontecerá. Nesta temática alerto para o seguinte exemplo:
Uma empresa que tenha faturado 123 000€ (IVA incluído) teve
como base tributável 100 000€, a estes serão abatidos os Gastos, as Matérias
Consumidas, etc. sendo apurado o lucro tributável, supondo que seria de 1 000.
Perante os novos fatos teremos 123 000/1.13 = Base 108 850€,
tomando a mesma base de cálculo estaremos perante um lucro tributável de 8
850¬+1000 = 9 850 – Vezes a taxa de IRC aplicável. Ou seja o valor que por
efeito da redução de taxa iva, passa a ser lucro e tributado na esfera de IRC,
com diversas repercussões. Influenciando o cálculo dos Pagamentos Por Conta
6. Recapitalizar as micro e pequenas empresas;
Possibilidade de dar um cunho progressivo ao imposto
Perante um tecido empresarial que está descapitalizado e
muito dependente do crédito bancário importa ter em devida conta o seguinte: a
estabilidade e segurança; a simplicidade; a redução da conflitualidade fiscal;
a diminuição da carga fiscal; a adoção de medidas que criem atratividade e
favoreçam a competitividade.
Poderia pensar-se numa forma de recapitalizar as micro e
pequenas empresas através da retenção dos lucros por um período de 5 anos, não
sendo tributados na esfera da empresa, sendo apenas tributados na esfera
particular do empresário a partir do 6º ano seguinte à sua obtenção, podendo
eventualmente na esfera particular ser tributado a uma taxa mais atrativa.
Poderia admitir-se contudo um sistema fiscal em sede de IRC, assente na
progressividade, criando escalões de incentivo, que pudessem permitir mais
competitividade.
A complexidade, a instabilidade das taxas de IRC, as
Tributações Autónomas e a não aceitação dos prejuízos em 100% em cada
exercício, tem prejudicado fortemente a atividade empresarial das Micro e
Pequenas entidades
7. As associações empresariais devem estar atentas
a este novo quadro
O novo pacote incentivos ao investimento será ajustado às
micro e pequenas empresas?
Segundo dados conhecidos, creio que haverá cerca de 60% que
acham que sim, é adequado e 40% acham que não. Competirá às Associações
Empresariais fazerem valer os seus pontos de vista para que possam vir a
existir ajustamentos.
8. Sistema fiscal – Competitividade – Agentes
empresariais
É verdade que o nosso sistema fiscal penaliza a
competitividade do País. Mas também é certo que os agentes empresariais têm de
fazer pela vida, adaptando-se às alterações da realidade de modo a serem
sustentáveis. Precisam de saber fazer o diagnóstico, apostar no planeamento
estratégico e na formação dos colaboradores.
9. E para finalizar
Gestão
é substituir músculos por pensamentos,
folclore
e superstição por conhecimento,
e
força por cooperação.
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